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Por um feminismo antirracista – reflexões de Angela Davis

Como inspiração, apresentamos uma breve homenagem a Angela Davis – negra, feminista e marxista – cuja notoriedade reconhecida mundialmente não é resultado somente de sua experiência como militante dos Panteras Negras na década de 1970, mas também surge de uma vida dedicada a uma proposta de ativismo político unificador.

A filósofa Angela Davis, um dos principais nomes do feminismo negro Foto: Arte sobre foto de Boris Roessler/picture-alliance/dpa

Aos 75 anos, a filósofa apresenta uma proposta de militância que não escolhe entre as categorias de ativismo – marxismo, feminismo ou antirracismo. Para Davis, estas são causas que se complementam em uma luta social única contra todas as formas de opressão – estas sustentam o capitalismo e o imperialismo econômico, estruturando a dominação de um grupo. A resposta de Davis é a construção social de uma política feminista radical que seja capaz de contrapor as injustiças que nascem do elo entre capitalismo, sexismo e racismo. Portanto, eliminar somente um destes alicerces não seria o suficiente para promover justiça social.

Nascida na década de 1940, quando a segregação racial no sul dos Estados Unidos era explicitada nas leis Jim Crow, Angela acompanhava a militância da mãe, Sallye Davis, que participava de movimentos em prol dos direitos civis dos negros. Aos 15 anos, Angela estava ligada ao Partido Comunista dos Estados Unidos. Em 1968, entrava para o Partido dos Panteras Negras.

Na década de 1970, torna-se vítima da opressão policial ao ser acusada injustamente de assassinato e ficando 17 meses na prisão. Este período traz à tona reflexões que dizem respeito ao sistema prisional e o fim da escravidão. Para ela, o encarceramento negro é um reflexo do fracasso do sistema democrático com esta parcela da população mesmo que a escravidão fosse formalmente cessada.

Em “Mulheres, raça e classe”, a autora avança no tema do feminismo, mostrando a ligação entre elementos econômicos, políticos e ideológicos que viabilizam a manutenção do modelo de produção capitalista. Ela explica que o suposto nascimento do trabalho livre, após a abolição da escravidão, não muda a forma como operam as opressões sociais – estas são apenas reconfiguradas aprisionando sobretudo as mulheres negras. Isto pode ser manifestado, ainda conforme Angela, nas tarefas ou papéis que seriam destinados a certos “grupos”. Neste contexto, as mulheres negras seriam condicionadas às atividades agrícolas e ao serviço doméstico (inerente a isso o abuso sexual por parte de muitos patrões). No caso das mulheres brancas e pobres, restaria o trabalho nas fábricas, enquanto para as burguesas a “nobre missão” de serem “donas do lar”.

Segundo a ativista, mesmo a valorização da maternidade e do universo feminino no século XIX são componentes que visam fortalecer a industrialização, deixando as mulheres fadadas a papéis de coadjuvantes. Se as donas de casa brancas não são consideradas produtivas deste viés, as negras não são sequer inseridas no mito da feminilidade – escravas e ex-escravas eram estupradas, mas nunca consideradas “mães” ou donas do lar.

Revelando os fatores que nos permitem visualizar as mulheres negras como as principais vítimas da opressão, Angela representa um posicionamento político baseado no elo entre feminismo, antirracismo e marxismo como única forma de promover uma mudança estrutural na sociedade. Uma das célebres frases da filófosa nos auxilia a visualizar a importância do feminismo antirracista:

“Quando a mulher negra se movimenta, toda a estrutura da sociedade se movimenta com ela, porque tudo é desestabilizado a partir da base da pirâmide social onde se encontram as mulheres negras. Com isso, muda-se a base do capitalismo”

Mais frases de Angela Davis:

“Não acredito que seja saudável escolher uma luta e dizer que é mais importante, mas reconhecer como as diferentes lutas se conectam”

“Quando as mulheres negras forem finalmente livres, o mundo será livre”

“Em uma sociedade racista, não ser racista não é o bastante. Temos que ser antirracista”

“Não reivindicamos ser incluídas em uma sociedade profundamente racista e misógina, que prioriza o lucro em detrimento das pessoas. Reivindicar a reforma do sistema policial e carcerário é manter o racismo que estruturou a escravidão. Adotar o encarceramento como estratégia é nos abster de pensar outras formas de responsabilização. Por isso, hoje faço uma chamada feminista negra para abolirmos o encarceramento como forma dominante de punição e pensarmos novas formas de justiça.”

Por Ana Prado

Fontes:

Angela Davis: “Quando as mulheres negras forem finalmente livres, o mundo será livre”. Por Andréa Martinelli. Disponível em: https://www.huffpostbrasil.com/entry/angela-davis-no-brasil_br_5daddd7ce4b0f34e3a7a6b67.

Angela Davis compara encarceramento à escravidão moderna. Por Midiã Noelle. Disponível em: https://jornalistaslivres.org/angela-davis-compara-encarceramento-escravidao-moderna/

Angela Davis: radical e libertária. Por Raquel Barreto. Disponível em: https://revistacult.uol.com.br/home/angela-davis-radical-e-libertaria/

[Resenha a:] DAVIS, Angela. Mulheres, raça e classe. São Paulo: Boitempo, 2016. Por Rafaela Cyrino. Revista Outubro. Disponível em: http://outubrorevista.com.br/resenha-de-davis-angela-mulheres-raca-e-classe-sao-paulo-boitempo-2016/.

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